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terça-feira, 15 de maio de 2007

Como desenvolver a atenção focalizada? Isto é possível?

Pode-se desenvolver a atenção focalizada como meio de se alcançar objetivos diversos: atingir níveis profundos na prática meditativa, diminuir o estresse e a ansiedade ou ainda melhorar a atuação na escola, universidade ou empresa. Comecemos pelo exame da temática em foco: o que é atenção focalizada? Em seguida, passamos à discussão de outra questão importante: como conseguir desenvolver essa capacidade cognitiva tão importante nos dias atuais devido à agitação de nossa época, aos ruídos contínuos que nos rodeiam e às condições materiais de nossa existência pouco favoráveis à vida interior?

Estou utilizando nesta discussão sobre a atenção alguns conceitos sobre a temática retirados do pequeno volume “La Méditations em 10 leçons” de Charles Groc de Salmiech. Paris, De Vecchi, 2005. Segundo esse autor que estudou a práticas meditativas orientais e se propôs a divulgá-las sem se ater a concepções religiosas ou esotéricas, a atenção é a faculdade que nos permite fixar o nosso pensamento sobre um objeto determinado durante certo lapso de tempo. A atenção é uma “tensão” em direção à mobilização da energia psíquica. Ela é a focalização do pensamento sobre um objeto determinado. Como tal, a atenção exige de nós atitudes ora passivas, ora ativas.

A atitude passiva é exigida, pois devemos estar receptivos à imagem ou idéia sobre a qual focalizamos o nosso pensamento. A atitude ativa, por sua vez, é requerida para registrar os detalhes e o todo do objeto de nossa meditação. A atitude ativa na focalização da atenção serve também para rejeitar as “distrações”, isto é, os elementos parasitas que tendem a invadir o nosso pensamento durante a meditação.

Assim, de acordo com o tipo de atitude assumida durante a atividade meditativa, podem-se distinguir dois tipos de concentração: a concentração emissiva e a concentração receptiva. A primeira permite-nos seguir o curso de nosso pensamento, sem que nos deixemos nos arrastar por eles, sem distrações. Se essa faculdade de concentração emissiva funciona mal, o encadeamento das idéias nos leva para longe de nosso foco e o tempo passa sem que o percebamos passar. Isso é particularmente danoso nas atividades escolares, acadêmicas e profissionais que exigem prazos e resultados.
Já a concentração receptiva permite-nos prolongar um ato consciente a fim de permitir que fiquemos inteiramente receptivos durante um período considerável de tempo. Por exemplo, é possível, por meio de treino adequado, ficar durante vários minutos sem que o cérebro passe à emissão. Essas duas formas de concentração representam dois aspectos de uma mesma faculdade cognitiva de domínio da mente

As técnicas meditativas foram desenvolvidas originalmente pelos místicos orientais, os iogues da Índia, os lamas do Tibete, os monges do Cáucaso, da China e do Japão. Os budistas do Oriente, e os do Ocidente, hoje disseminados por todo o mundo, são capazes de chegar a estados superiores da consciência graças a uma disciplina rígida a que se submetem durante anos.

No Ocidente, as tradições cristãs e as esotéricas também desenvolveram práticas meditativas. Cada uma dessas tradições as utiliza à sua maneira e de acordo com o sua convicção. Nos mosteiros, ela é praticada por aqueles que almejam alcançar níveis elevados de consciência e de iluminação. Esses seres iluminados pela evolução espiritual passam a ser denominados “santos” pelas instituições que os abrigam, após longo processo de canonização, como é o caso da igreja católica.

Entre nós, a meditação tem atraído a atenção tanto de cientistas – para verificar as modificações ocorridas no cérebro, e conseqüentemente no comportamento – quanto de um número cada vez maior de pessoas interessadas na evolução pessoal e nos benefícios que a sua prática lhes propicia.

Sabe-se que a meditação é um elemento importante para se conseguir o progresso tanto interior quanto exterior. Ela facilita o conhecimento sobre si mesmo nos três planos que constituem nosso caráter e nossa personalidade: os planos intelectual, físico e psíquico. Além disso, ela facilita a reformulação pessoal, o aprofundamento interior para se corrigir e se aperfeiçoar continuamente em busca da evolução tanto espiritual quanto intelectual. Creio, entretanto, que os aspectos mais importantes da meditação são permitir alcançar níveis superiores de consciência, com base em auto-avaliações e redirecionamentos de condutas e de atitudes. Graças ao maior nível de consciência, podemos nos libertar do jugo das idéias que nos foram impostas desde a nossa infância e que formam os quadros mentais que condicionam nossa maneira de sentir, de perceber o mundo e de interagir com ele.

No mundo profano, a meditação conseguida pela atenção focalizada ajuda a reflexão sobre problemas filosóficos, políticos e mesmo materiais. Podemos meditar sobre a maioria de atos e gestos do dia-a-dia, como a opção mais adequada no plano profissional, familiar e pessoal, ou mesmo a busca de uma melhor estratégia de venda.

Há diversas classificações e tipologias atribuídas à meditação, dependendo dos objetivos a que se propõem seus praticantes. Nessa discussão, vamos nos ater ao tipo de prática meditativa que requer o domínio do corpo pela mente. Isso é conseguido por meio de exercícios de tomada de consciência do corpo, seja dirigindo a atenção para as sensações internas, seja para as externas. Realizam-se atividades de focalização da atenção com o auxílio da respiração, em que se focalizam estados, imagens e impressões sensoriais mentais conscientes. Vale lembrar que essas imagens mentais não são somente visuais. Todos os outros sentidos deverão ser exercitados por meio da tomada da consciência. Assim, as atividades de meditação devem seguir um método e orientação de pessoas mais experientes e familiarizadas com esse tipo de prática.

No livro “La Méditation em 10 Lessons”, Salmiech apresenta os métodos e as descobertas de dois médicos pesquisadores: o Dr. Caycedo e o Dr. Vitoz. Dr. Caycedo foi um médico psiquiatra e neurologista (1932) que pesquisou e registrou durante dois anos práticas meditativas das mais diversas tradições orientais. Ele elaborou um método baseado nos princípios vivenciados durante a viagem ao Oriente e estudou os efeitos da meditação sobre o comportamento.

Esse pesquisador adiantou-se às pesquisas atuais da neurociência e da psicologia cognitiva (http://www.mindandlife.org/conf04.html), Tendo vivenciado ele mesmo as práticas meditativas durante cinco anos ele registrou os resultados alcançados. Depois de avaliados os resultados, ele elaborou o método denominado “relaxamento dinâmico” fundado em três grandes linhas espirituais do Oriente: o “relaxamento dinâmico de concentração” (inspirado na ioga), o “relaxamento dinâmico contemplativo” (inspirado no budismo) e o “relaxamento dinâmico meditativo” (inspirado no zen japonês). Maiores detalhes sobre o método, consultar o site http://www.sofrologia.com/so_metodo.htm.

Já o Dr. Vittoz (1863 – 1925) foi um médico suíço, especialista no tratamento de uma forma de neurastenia que se caracteriza pela perda do controle cerebral sem lesões orgânicas. Foi um dos pioneiros no tratamento com as bioenergias. Para restabelecer a unidade entre o consciente e o inconsciente, « controle cerebral », o Dr. Vittoz propõe um método que se apóia no desenvolvimento da consciência: (1) primeiramente, sobre as funções sensoriais e corporais; (2) depois, sobre funções mais complexas como a concentração e a vontade; (2) finalmente, sobre a consciência das emoções.

O paciente, acompanhado de seu terapeuta, descobre exercícios com os quais ele toma consciência: do seu funcionamento cerebral, do seu grau de desvio e de sua atitude pessoal em querer melhorar. Graças à prática de exercícios simples, o Método permite: (1) desenvolver a consciência corporal e sensorial. (2) melhorar a concentração e a memorização; (3) acolher as emoções e as idéias que invadem o momento atual e melhor gerenciá-las.

Os que praticam o Método Vittoz garantem que não se trata de um método de relaxamento, mas de uma técnica de reeducação do controle cerebral e do domínio de si mesmo. A reeducação começa por atos conscientes que fazemos durante o dia: andar, ver uma imagem, sentir o odor de uma flor, abrir uma porta, apreender uma paisagem ou a presença física de uma pessoa. Todos esses atos banais que fazemos devem se tornar conscientes. Devemos nos concentrar sobre as funções sensoriais requeridas para realizar as ações do cotidiano realizadas automática e inconscientemente como o apoiar os pés no chão, o sentir a temperatura e a constituição física dos objetos, etc.

Após essa fase de concentração receptiva do exterior, passa-se a exercícios voltados para a percepção interior. Constituem exemplos dessa atividade: perceber o próprio corpo, escutar a respiração e a pulsação do sangue nas veias, concentrar-se sobre uma imagem mental dinâmica de grafismos como o signo do infinito, números, letras, etc., passando-se, em seguida, para a concentração sobre uma idéia que precisa ser focalizada, seja de natureza prática, filosófica, política ou familiar.

Por último, vem a reeducação psíquica: exercícios para a memória, exame das perspectivas de vida e, sobretudo, neutralização dos pensamentos negativos por meio de uma higiene mental: afastar as idéias e pessoas negativas, criar novos modelos mentais positivos. Essa nova atitude permite ao paciente viver intensamente o momento presente, não no passado ou no futuro.
Apresentamos nessa discussão uma introdução ao conceito da atenção focalizada relacionando-a a práticas meditavas desvinculadas de cunho religioso ou dogmático. Foram apresentados os métodos de dois médicos preocupados com a recuperação neurológica de seus pacientes, o Dr. Caycedo e o Dr. Vittoz. Em uma próxima postagem, tentarei discutir a atenção focalizada relacionando-a a objetivos educacionais.
Cirlene Magalhães

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