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domingo, 6 de novembro de 2011

Paradigmas Científicos, Consciência e Espiritualidade


Paradigmas Científicos, Consciência e Espiritualidade



Como harmonizar espírito e corpo, espiritualidade e matéria? Esses termos parecem, a priori, estar em oposição e ser irredutíveis, tanto para os que se apóiam no senso comum, como para cientistas. Para a grande maioria das pessoas, espírito e corpo remetem a duas realidades totalmente distintas. Qual seria a razão dessa percepção dissociada? Frente a essa problemática, o 1º  Fórum Espiritual Mundial,  realizado em Brasília de 6 a 10 de dezembro de 2006 se propôs a discutir, sob perspectivas e credos religiosos diversos, questionamentos cruciais sobre realidade e espiritualidade.

Certamente, esse encontro trará conseqüências benéficas e ainda pouco previsíveis para a comunidade local e mesmo planetária ao colocar em questão, entre outros temas, tópicos fundamentais para a evolução da espécie humana e para os indivíduos em particular como realidade, consciência e espiritualidade.

A afirmação pode parecer falaciosa, exagerada e mesmo não científica para os adeptos do paradigma realista objetivista, ainda prevalente nas ciências e na atual concepção de mundo e de matéria. Na visão objetivista, considera-se que a realidade é tal qual nosso aparato corporal parece apreender. Postula-se a existência de uma realidade dada e estruturada, regida por leis imanentes e dissociadas do sujeito. Nessa visão de mundo, espírito/consciência, por um lado, e cosmos/matéria, por outro, estão separados. A realidade nos é dada de antemão e é regida por leis que são acessíveis e inteligíveis pelo entendimento intelectual e pela verificação empírica. Uma das possíveis explicações para a visão dualista que dissocia a relação mente e corpo pode estar ligada ao medo da morte do ego e ao desejo de perpetuá-lo. De acordo com essa concepção, dicotomias como espírito e matéria, corpo e mente, ciência e espiritualidade são conceitos impossíveis de serem conciliados.

 Pelo contrário, os familiarizados com o paradigma holístico e quântico (Heisenberg, Goswami) ou mesmo os que se identificam com a teoria das estruturas dissipativas e a auto-organização dos sistemas (Prigogine) e a auto-organização dos sistemas vivos (Maturana e Varela), todos eles acreditam que haja "unidade", em diferentes níveis, de todos os seres vivos entre si e com o próprio universo.Trata-se de uma alternativa complementar à tese dualista que a estende e a amplifica, frente aos avanços na ciência, em especial, na física, na química, na biologia e nas ciências cognitivas.

Essa nova maneira de conceber a realidade passa por uma melhor compreensão do lugar do ser humano no cosmos, além de estar inteiramente de acordo com o conhecimento científico atual. Na física quântica, Heisenberg introduz o “Princípio da Indeterminação”, que salienta o papel do observador na percepção da realidade. Esse princípio daria suporte à tese das múltiplas possibilidades de manifestação da matéria, em que o observador é o espírito, questão bem ilustrada no filme What the bleep do we know?

Fundamentando-se na física quântica, Goswami dá sua explicação científica para a reencarnação, a imortalidade e experiências quase morte e coloca a consciência como o cerne da problemática. Na biologia, Maturana, Varela e Uribe utilizam pela primeira vez, na literatura internacional, em 1974, o termo Autopoiese que significa autoprodução. Em um sistema vivo, a estrutura se reproduz e muda continuamente. Ele se nutre e se adapta constantemente e está sujeito às modificações ininterruptas do ambiente que o nutre e o contém. Aquilo que acontece em um sistema em dado momento depende de sua estrutura naquele momento e, portanto, está sujeito a possibilidades diversas ao se manifestar como evento ou matéria. Na química, Ilya Prigogine, Prêmio Nobel de Química em 1977, cria, no decorrer de sua extensa pesquisa sobre o tempo e a matéria, a teoria das estruturas dissipativas e a dos sistemas auto-organizadores e inaugura a “era da incerteza”. Suas pesquisas demonstram o fluxo irreversível do tempo, ou seja, a existência de instabilidades e flutuações que ocasionam padrões evolutivos em todos os níveis de manifestação da matéria. Assim, desde a cosmologia do universo à biologia das células, tudo na natureza evolui com base em possibilidades. Em vista dessa extensa literatura sobre a nova concepção do real, somos levados a concluir que a consciência seria um fator de interferência na criação da realidade.

Por outro lado, outra maneira mais familiar de explicar a consciência apóia-se na psicologia do desenvolvimento (Piaget, Vigotski). Perguntamo-nos: como um pensamento, um estado do “eu” e até mesmo a consciência podem proceder da matéria? Como a consciência pode criar a realidade? Se isso de fato for verdade, choca terrivelmente o senso comum. Entretanto, tudo se torna muito lógico se for considerado o fenômeno da evolução e os recentes estudos da física quântica. Tudo o que faz um indivíduo é o produto de duas evoluções: a das espécies e a que o indivíduo produziu dentro de uma determinada espécie. Disso resulta que o ser humano, tal como hoje o concebemos, provido de inteligência e de consciência, não surgiu do nada. A sua capacidade de conhecer, de antecipar, de projetar, de representar, de se comunicar verbalmente e de criar artefatos desenvolveu-se lenta e paulatinamente em interação com o meio ambiente.

Com efeito, uma criança antes de falar não tem a idéia bem estabelecida do “eu”. Ela é inteira. É ao falar, ao interagir com os seus semelhantes que a criança constrói a noção de “si mesmo” e se identifica como um objeto particular, diferente do outro e do mundo. Geralmente, por volta de 18 a 24 meses, surge a consciência na criança. Ela começa a perceber-se como “eu” e a ser capaz de causar mudanças no mundo. Se, por um lado, há uma pequena parte da consciência que se apóia na linguagem, por outro lado, há enormes conteúdos da psique que não têm acesso à linguagem articulada e que se exprimem sobre a forma de projeções e de imagens arquetípicas à espera de vir à tona pela progressiva evolução da consciência.

Cremos que a exacerbação do “eu” desarticula e desintegra o ser humano, tornando-o um predador de si mesmo, dos seus semelhantes e do ambiente natural e social, afastando-o de sua essência espiritual divina. Se adicionarmos às duas tradições acima a prática da meditação como um antídoto para a dissociação espírito/matéria, certamente estaremos contribuindo para a elevação de nosso nível de consciência e afetando, de alguma forma, os nossos semelhantes, bem como o mundo que habitamos. Estaremos criando a realidade, ou seja, direcionando-a para possibilidades mais adequadas à natureza do nosso ser, se forem escolhidos padrões apropriados de rotinas neurais e ou comportamentais, sejam eles de pensamentos saudáveis, de relacionamentos sadios e até mesmo de relações adequadas com o ambiente natural e social.


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